6.8.06

Candidatos que não têm nada a dizer

Eu ouvi mal ou surgiu no meio de tantas mudanças propostas para a propaganda eleitoral a idéia de proibir carro de som? Devo ter ouvido mal, porque as nossas ruas estão infestadas deles. Que bom se tivesse sido aprovada tal proibição! Quanto é insuportável ter que agüentar o dia inteiro rodar o carro de som anunciando o nome de um político que passou quatro anos desaparecido. De repente lá está seu nome, subindo e descendo a rua em alto volume e ficamos sabendo por um locutor, que ele trava uma batalha incessante por nós, em Salvador ou em Brasília. Deve ser por isso, por ele ter estado tão ocupado, que passamos os últimos quatro anos sem nem saber se estava vivo ou morto, pois nada disse e até a imprensa tem dificuldade de encontrá-lo. Deve ser por isso que não teve tempo nem de gravar uma mensagem de saudação aos eleitores para rodar no bendito carro de som.
Ou talvez tenha estado desaparecido ou nunca o vejamos se manifestar porque ele não tem mesmo o que dizer. A forma como as campanhas da maioria (ou quase a totalidade) dos candidatos é feita, demonstra isso.
No papel, onde os candidatos poderiam dizer o que pensam e se comprometer com algumas propostas, limitam-se a distribuir santinhos. No máximo, se encontra um calendário no verso. Olhamos para a carinha deles ali, emoldurada pelo nome e número. Só consta o nome do partido porque a lei tornou obrigatório. Quem é ele? O que propõe sobre os assuntos que preocupam o eleitor? Quem sabe? Será que tem mesmo uma proposta?
Como a campanha não se dá por idéias nem projetos, restam dois meios: a compra de votos e a lavagem cerebral. É preciso decorar o número. O nome não, o número. Decorar o número está acima de tudo. Nem importa muito saber quem é o dono do número. Se o eleitor associar demais o nome do candidato ao número, pode até ser que num momento de lucidez, no dia da eleição, se dê conta de que está votando num candidato que ele não sabe quem é e nem o que pensa. Não, o eleitor não vota em um nome, nem em um homem, nem em um conjunto de idéias. Ele vota num número.
Então, é carro de som o dia inteiro, o eleitor tem que dormir e acordar com aquele número na cabeça.
Para ajudar a fixar, nada melhor do que uma musiquinha. Olhando a letra delas, nota-se que qualquer uma serve para qualquer candidato. Não há nada de específico. Parece que os compositores de jingles têm um estoque na prateleira, esperando um interessado bater na porta:
– O que é que você tem aí? – quer saber o candidato.
– Olha, as músicas todas falam que o senhor é trabalhador, honesto e competente. Que vai lutar pela saúde, educação e mais emprego. Só muda o ritmo. Olha esse aqui – sugere o “artista”.
– Não, tá muito desanimado – decreta o candidato.
– E esse outro, em ritmo de forró?
– Não, o São João já passou.
– Então, eu vou lhe mostrar o melhor de todos. Tem vários candidatos interessados nele. Eu vou vender a quem der o melhor preço.
Depois de ouvir, o candidato concorda entusiasmado: - Ah, esse é o melhor mesmo. Eu pago.
– À vista, por favor – garante-se o compositor.

Publicado na Tribuna Feirense em 5 de agosto

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