19.8.06

O novo Lula é o velho Lula

Dizem, com razão, que o Lula da eleição de 2002 foi obra de Duda Mendonça. Que o marketeiro apagou do mapa a imagem de homem do povo, deu-lhe um banho de loja, um ar grave, para aparentar preparo, maturidade e competência. Lembra do tempo em que se ouvia dizer “eu não voto nesse Lula, que é um ignorante analfabeto despreparado”? Isso desapareceu.
O Lula de Duda Mendonça estava muito mais para empresário que operário. E de repente, em 2006, com Duda expurgado da campanha, o mundo gira e Lula volta para o mesmo lugar de onde saiu. Ele agora é homem do povo, “a cara do Brasil”, como diz sua propaganda.
Em propaganda de candidato grande, nada é por acaso e tudo se faz com base no que dizem as pesquisas. Se em 2002 convinha repaginar o Lula, em 2006 é preciso que as pessoas pensem nele como um amigo ou parente próximo. É que mudou o público-alvo, como diriam os publicitários.
Em 2002, Lula tinha que ter cara de empresário porque precisava do voto da classe média pra cima. Hoje ele se equilibra no topo das intenções de voto graças aos clientes do Bolsa Família. O negócio agora é ser da família do Lula (São milhões de Lulas povoando o Brasil, diz o jingle oficial da campanha).
Nesse ponto o marketing não poderia ser mais acertado. Lula é mesmo a cara do Brasil quando dá um jeitinho de desculpar os companheiros que andaram pisando na bola e até “traindo sua confiança”. Quando demonstra enorme dificuldade em dispensar os amigos que aprontaram. Quando age como se as regras valessem apenas para os desafetos, mas não para os amigos. Quando se finge de santo ingênuo, que não sabia de nada.
Lula tanto é a cara do Brasil que nem nome usa, mas apelido. Já seu adversário é a cara de São Paulo, tanto que não usava o nome, mas sim o sobrenome, como se faz no sisudo Primeiro Mundo, organizado e desenvolvido.
Finalmente os marketeiros do PSDB descobriram que o tucano disputa eleição no Brasil e não em São Paulo e apagaram o Alckmin, fazendo surgir o Geraldo. Prejuízo não vai ter, já que ninguém sabia mesmo quem era o Alckmin (eu mesmo que trabalho com isso, para saber como se escrevia o nome – que tem apenas uma letra I – tive que consultar o site oficial).
Muito dura a vida do tucano. Tem que bater na porta da casa das pessoas com aquela cara de vendedor de enciclopédia. A dona da casa abre, mas atende ali na porta mesmo, não deixa entrar. Dentro, ouve-se um burburinho, umas gargalhadas de gente meio alta de algumas doses a mais. Geraldo ouve uma voz rouca e uns erros de concordância familiares. Como é comprido, espicha o pescoço, dá uma olhada pra dentro e lá está o Lula, sentado na mesa, em altos papos com o outro Lula dono da casa. Assim fica difícil.

Publicado na Tribuna Feirense em 19/08/06

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