24.7.10

Lula Superstar

É gol do Brasil? Não. É a reação do público ao anúncio da chegada de Lula ao evento.

Ivete Sangalo subiu ao palco? Não. Lula vai começar a falar.

O presidente pop desperta a euforia dos presentes. Tanto no Encontro da Agricultura Familiar, onde na prática está entre militantes petistas, quanto na inauguração de conjunto popular para famílias com renda entre 0 e 3 salários mínimos, onde Lula é idolatrado pelos beneficiários do Bolsa Família.

A entrega de chaves dos apartamentos foi o palco perfeito para o Lula emotivo, que o próprio admite estar aflorando mais intensamente à medida que se aproxima o fim do mandato. Contribuiu o fato de que a primeira a receber, Ana Maria de Jesus, já foi se desmanchando em lágrimas ao pegar as chaves das mãos do prefeito Tarcízio Pimenta. Depois quis, é claro, abraçar e beijar Lula, que repetiu o gesto um por um com os selecionados para a entrega, escolhidos a dedo: uma idosa, um casal de cegos, dois casais com recém-nascidos, todos abraçados e beijados pelo presidente, que posou para fotos com todos, de olhos marejados.

Depois da entrega das chaves, Lula fez um pronunciamento onde falou do próprio passado, da primeira passagem por Feira de Santana, aos sete anos, no pau de arara rumo a São Paulo; do retorno no final dos anos 70, em um ato de desagravo ao histórico opositor da ditadura, Chico Pinto, já falecido e que “deixou saudades”. A propósito Chico Pinto foi o nome dado à invasão no Aviário, próximo do local reservado para a construção de uma escola técnica federal, que Lula prometeu na campanha de 2006, mas não saiu do papel. Moradores da invasão estavam lá, erguendo uma faixa e aplaudindo o líder do movimento, Jader Dourado, trajado como o Lula pré-2002, de camiseta de algodão, destoando do paletó de políticos e empresários que preenchiam o tablado.

O trajeto entre a Estação da Música (onde ocorreu o Encontro da Agricultura Familiar) e o conjunto Conceição Ville (nome “chiquérrimo” segundo Lula) pode ter lembrado também a Lula outra promessa descumprida da campanha de 2006, em comício na praça da Matriz: a duplicação do Anel de Contorno. Claro que ele, nem ninguém, tocou no assunto.

As promessas dessa vez se limitaram à habitação mesmo, um golaço que coroou o fim do mandato de Lula, corroborado por Tarcízio Pimenta. “O senhor estava iluminado quando criou este programa”, definiu o prefeito em sua breve fala. Lula confirmou que o Minha Casa Minha Vida 2 (MCMV2) terá o dobro do número de casas do primeiro (cuja meta de um milhão de moradias contratadas deve ser alcançada até o final do ano) e já fez algumas solicitações ao vice-presidente da Caixa, Jorge Hereda, presente ao evento: que faça adaptações para pessoas cegas, como o casal que recebeu as chaves em sua mão, que contrate mão de obra no próprio bairro onde estiverem sendo construídas as casas e que coloque acabamento com azulejo e cerâmica.

Aproveitou para fazer graça, contando que a primeira casa que comprou com Marisa e morou com mais três crianças tinha 33 metros quadrados e se tinha visita ficava tão apertada que levantando o pé para matar uma desgraçada duma barata não achava mais espaço para colocar de volta no chão.

Definiu o apartamento do Conceição Ville como “bonzinho” e avisou que tinha 42 metros quadrados. A propósito da colocação de material melhor no MCMV2, contou detalhes de reunião no Planalto sobre desoneração de impostos de material de construção, quando ao propor reduzir também sobre azulejo e cerâmica, um auxiliar disse que pobre não gostava disso. “Você é um besta, que não entende nada de pobre. Pobre se puder coloca azulejo até na cama”, disse na cara da vítima. Então passou a evocar a célebre frase do carnavalesco Joãozinho Trinta, segundo o qual, quem gosta de miséria é intelectual, porque pobre gosta é de luxo. E partiu para outros exemplos: uísque ao invés de cachaça e salão de beleza para se enfeitar. Segundo Lula, esta atividade proliferou nos lugares mais pobres, a partir do momento em que as pessoas começaram a ter um pouco mais de dinheiro, em seu governo.

Depois de divertir o público com suas tiradas, despediu-se, alegando que precisava chegar a Garanhuns antes da chuva. Mas retardou um pouco mais a viagem, pois na saída não resistiu a mais uma atitude de ídolo popular, jogando-se nos braços do público, que formou um corredor junto às grades de isolamento.

Difícil imaginar um cenário em que o presidente mais popular da história não volte ao poder, caso queira, na eleição de 2014.

(as fotos de Reginaldo Pereira mostram Lula acenando da janela do apartamento que inspecionou, os abraços e fotos tirados com a primeira a receber as chaves, Ana Maria de Jesus - a mais chorona - com o casal com bebê, o casal cego com bebê, o início da aproximação com o povo além das grades e o presidente já "afogado" em meio à multidão)

Posted via email from Glauco Wanderley

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