Os últimos cinco anos foram ricos em descobertas arqueológicas na Bahia, que agora vive uma fase de aprender a explorar estes recursos, de maneira que a população saiba valorizar e preservar o patrimônio.
Descoberta em 2005 e aberta ao público há apenas três anos, a Serra das Paridas, em Lençóis, Chapada Diamantina, é um exemplo de como o patrimônio pré-histórico pode ser uma fonte de pesquisa e conhecimento sobre as origens do homem pré-colombiano, e ao mesmo tempo atração turística.
A fazenda onde se localiza o sítio arqueológico é propriedade particular. Segundo Renato Hayne, da agência de turismo que explora o local, no ano passado, terceiro ano da abertura, quatro mil visitantes estiveram na Serra.
Os estudos estão no começo. Considera-se que há 18 diferentes sítios na propriedade, mas apenas três estão abertos ao público. A Serra das Paridas possui uma coleção extensa de pinturas rupestres, cuja autenticidade foi atestada pelo professor Carlos Etchevarne, argentino radicado na Bahia há 20 anos e que dirige o departamento de Antropologia da UFBA (Universidade Federal da Bahia).
Quando ocorreu a descoberta das pinturas em grandes rochas de arenito (a uma distância de 35 quilômetros do centro de Lençóis), ele foi chamado pelo dono da propriedade para verificar se o achado tinha mesmo valor científico. Não há dúvida quanto a isso. Mas os avanços são lentos, em uma área em que as suposições são muitas e as certezas poucas.
Os métodos de datação existentes não permitem descobrir a idade das pinturas. Há uma tentativa em curso, através de uma técnica ainda em fase de testes, batizada de paleomagnetismo. Sabe-se que os metais presentes na tinta são atraídos pelo campo magnético do planeta. O campo magnético oscila, por razões desconhecidas e de maneira aleatória. Como já existe um mapeamento histórico desta oscilação do magnetismo da terra, acredita-se que seja possível determinar a época em que ocorreu a pintura, de acordo com a direção em que os metais da tinta se fixaram ao secar.
O método vem sendo testado com sucesso na datação de cerâmicas indígenas com idade aproximada de 500 anos. Em relação à arte rupestre estão sendo colhidas amostras em sítios na Bahia, para tentar determinar a validade de se aplicar o mesmo mecanismo de medição. Além de mais antiga, a arte rupestre é mais complexa, porque é comum que desenhos de novos indivíduos ou grupos ocupantes da região sejam sobrepostos aos mais antigos, formando camadas de desenhos. Nas pedras do sítio de Lençóis é bem visível esta sobreposição de desenhos com idades distintas.
A maior parte do que está pintado são formas geométricas. Porém repete-se com freqüência a figura de mulheres de cintura larga e pernas abertas sugerindo o momento do parto. Daí o nome de Serra das Paridas, termo comum no interior para designar a mulher que teve filho recentemente.
Parte das pinturas pode ser vista de longe, antes da subida da trilha preparada pelos administradores da serra para orientar os visitantes. “Sem dúvida é um sistema de comunicação. A intenção era indicar algo”, interpreta Etchevarne sobre os desenhos mais visíveis. E adverte que não se pode ir mais longe na interpretação, nem mesmo especulando sobre o que se desejava indicar. Outras pinturas estão escondidas e vão sendo descobertas aos poucos.
COMO PRESERVAR
Uma das preocupações em sítios arqueológicos é não precipitar escavações. “Quando se faz uma escavação se altera o cenário original”, ensina o antropólogo da UFBA. Ele ressalta que o fato de não haver meios de datar os achados, torna ainda mais clara a necessidade da preservação, para garantir a fonte de dados quando tais recursos forem desenvolvidos. “Há 50 anos não havia o Carbono 14 e hoje é um método mundialmente aceito para datações”, exemplifica Etchevarne, lamentando que não sirva para determinar a idade das pinturas nas rochas.
Por outro lado, o conhecimento escasso sobre origem e significado traz riscos para a preservação. O assunto foi levantado durante as discussões do V Seminário de Arte Rupestre da UFBA, patrocinado pelo Ipac (Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia) que aconteceu de 23 a 25 de agosto em Lençóis, juntamente com a III Reunião da Associação Brasileira de Arte Rupestre.
Nos debates os pesquisadores mencionaram que muitas vezes os desenhos são vistos como criação de povos primitivos e nada mais, como se fosse algo de pouco valor. Com a execução no país de obras de infra-estrutura como hidrelétricas e estradas, há sítios que ficarão ameaçados, caso sua importância não seja reconhecida.
Um dos momentos de maior repercussão no evento, foi o relato sobre o trabalho em Nova Olinda, município da Chapada do Araripe, no Ceará. A pequena cidade, com apenas 5 mil habitantes na sede, recebe 33 mil visitantes por ano, em função dos achados arqueológicos relacionados ao “homem do Cariri”. Segundo a arqueóloga cearense Rosiane Limaverde, o envolvimento da comunidade na gestão do patrimônio é total. Crianças e adolescentes participantes do projeto gerenciam o museu, são guias e ajudam nos trabalhos de campo.
Comprometimento semelhante os estudiosos esperam ver estendido a todas as regiões que possuem este tipo de patrimônio. No final do Seminário, foi lançado o Manifesto de Lençóis, propondo uma Campanha Nacional de Preservação de Sítios de Arte Rupestre.
FOTOS: REGINALDO PEREIRA
gostei do blog muito informativo e bem feito
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