6.7.09

Teatro do absurdo

(Sala do Controle de Trânsito. Chefe e Capadócio conversam com ar de preocupados)

– As pessoas não param de reclamar do trânsito. Nada do que a gente inventa agrada – observa o capacho.

– Claro. Nós queremos botar ordem. Fazer cumprir a lei. Eles querem bagunça – rebate o chefe. – O que mais a gente pode fazer para consertar isso? Você já viu como sobem e descem voando os nossos viadutos? Nem ao menos apreciam a paisagem.

– Não é tanto assim. As multas até que diminuíram, as pessoas estão respeitando...

– Não diga bobagem – interrompe o Chefe. – E a gente vai viver do quê? São muitas panças pra alimentar nessa autarquia. – Eu tenho uma ideia. Vai lá no viaduto J.J.J.J. Observa qual a velocidade pra subir e descer. Faça o teste você mesmo.

(o Chefe fica só, falando com seus botões)

– Agora eu mato dois coelhos com uma cajadada só. Disciplina pra uns, multa pra outros. Essa não falha.

(Sobe o BG daquela música com som de caixa registradora, Money, do Pink Floyd. Enquanto o Chefe sonha o Capadócio volta).

– Fui lá. A rampa é alta. Pra subir a gente chega logo em 60 Km e aí desce no embalo e já viu. Eu não olhei direito no velocímetro pra não bater o carro.

– Já basta. Volta lá e coloca uma placa de 50 km e um radar. Rápido. Fica olhando e amanhã me conta o que viu.

(dia seguinte, mesmo cenário e personagens)

– Cadê o relatório?

– Foi um horror, chefe. Com medo do radar e dos 50 km o povo começou a subir devagar, devagar. Quem vem atrás é burro e buzina em pleno viaduto. Eu mesmo fui tentar e é ruim demais! Tem que descer pisando no freio. Olha meu carro lá fora, amassado, que entraram no fundo. Teve uma senhora que foi subir devagar demais, o carro começou foi a querer descer. Ela puxou o freio de mão e o carro ficou empacado no meio do viaduto, não subia nem descia. Daí ela também ficou travada. Fez uma fila atrás e o carro só saiu depois que ela trocou de lugar com a amiga que estava de carona, porque a dona não tinha coragem de soltar o freio de mão na ladeira...

O Capadócio dramatizava tanto que não via o brilho de felicidade nos olhos do Chefe. Só acordou quando ouviu:

– Maravilha, melhor do que eu pensava. Perfeito. Tá vendo? Acabaram os excessos. Vamos fazer isso nos outros viadutos iguais àquele.

Tentando agradar a qualquer custo, o Capadócio se converteu logo ao novo sistema e apresentou duas idéias.

– O senhor tá lembrado que o tráfego de carroças foi proibido lá? Então? Se a gente liberar as carroças pra subir aquelas rampas, vai ficar perfeito. Ah, e lá no Nova Cidade, que tem aquela pista bem larga, que não tem cruzamento de carro, nem passa ninguém a pé, que tal se a gente colocar também um radar, logo depois do pedaço que o pessoal acelera pra subir? 50 km! Nossa! Todo mundo só passa ali a 100 km. Vai ser um sucesso!

O Chefe pensou, pensou e respondeu: – Olha, eu tô entendendo as tuas intenções. Mas como eu sou uma pessoa boa e sensata, vamos esquecer esse negócio de liberar a passagem de carroça lá por cima. E na Nova Cidade, a gente pode botar o radar, tudo bem. Mas pra provar que eu sou bonzinho, vai ser 60 km. Pode ir.

Um comentário:

  1. Anônimo7/7/09

    Transito é um assunto para se discutir eternamente, debater propostas de melhoria e não ficar fazendo testezinhos medíocres se vai ou não dar certo.
    Parece mais uma forma de arrecadar imposto do que impor leis!
    É impossível que ninguém perceba tais delírios cometidos pela SMTT.

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