12.5.10

Impasse na reforma da Senhor dos Passos

FOTOS: REGINALDO PEREIRA


Interditada em março depois da queda do segundo pináculo do alto do templo, a igreja Senhor dos Passos, no centro de Feira de Santana, não tem data para reabrir. Um projeto visando obter verbas para a restauração está sendo elaborado, mas nem a vistoria iniciada no momento da interdição foi concluída. Há divergências entre a posição da igreja e de técnicos do governo municipal.

Na fase inicial da apuração, o engenheiro civil Pedro Elias Pinheiro, da prefeitura, detectou problemas graves tanto no revestimento externo quanto na própria estrutura. Falta ainda um parecer sobre o telhado, que os técnicos não conseguiram analisar completamente, por falta de equipamento adequado de segurança. Entretanto foi possível identificar que há infiltrações.

Esta opinião do engenheiro é contestada pelo padre Miguel Francisco de Souza, pároco da Senhor dos Passos. Ele conta que desde a primeira queda de um pináculo, ainda em 2009, mandou fazer dois laudos sobre a situação da igreja. Nenhum apontou problemas na estrutura. Os danos se limitam aos pináculos e à torre, que podem desabar caso não sejam cuidados. Embora o segundo laudo tenha reconhecido o risco para a vida dos freqüentadores e recomendado a interdição, o padre afirma que a estrutura não está ameaçada de desabar e insiste que o problema é restrito a torre e pináculos.

Miguel Francisco reclama que a demora na entrega do laudo da Defesa Civil do município está atrasando o encaminhamento do projeto de reforma, a cargo de um engenheiro do Ipac (Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural, órgão da secretaria de Cultura do estado da Bahia). A expectativa da igreja é que sejam gastos seis meses na reforma.

O engenheiro Pinheiro diz que para ter uma noção exata do estado da construção e de tudo que precisa ser feito, é necessário retirar amostras do templo e levar para testes em laboratório. Ele entende que não se pode ter pressa numa questão deste tipo e que napo pode assinar um laudo sem adotar os procedimentos técnicos estabelecidos pelas normas da engenharia. Mas o padre Miguel alega que este tipo de análise já foi feita quando a igreja pediu laudos a terceiros.


RISCOS ESTRUTURAIS

Para o engenheiro, além dos problemas causados pela ação do tempo e da falta de manutenção, há riscos decorrentes da própria estrutura, que jamais foi adequada. Pinheiro observa que não há pilastras. As colunas aparentes são classificadas como “colunas falsas”, porque feitas com tijolo e sem concreto. “A nave (a parte interna onde se reúnem as pessoas) não tem qualquer sustentação”, alerta o engenheiro. Ele considera que a intervenção necessária para recuperar a igreja será uma obra de porte razoável, que não poderá ser feita rapidamente. “É praticamente uma reconstrução”, define.

O engenheiro constatou que o material do revestimento externo não tem boa aderência em relação à parte interna e por isso há o risco de descascarem e desabarem pedaços. “Foi fixado com uma argamassa de cal e saibro, que não forma um conjunto homogêneo com os tijolos antigos da estrutura”, explica. Mesmo que finos, com pouco mais de um centímetro de espessura, podem causar danos se caírem pedaços grandes.

De acordo com o secretário municipal de Prevenção à Violência, Mizael Freitas, ao qual está subordinada a Defesa Civil, responsável pela interdição, houve dificuldade de dedicar tempo à questão da igreja, em função dos estragos provocados pela chuva na cidade no começo do mês de abril, que ocuparam os profissionais da prefeitura. A cidade teve muitos alagamentos e alguns desabamentos e foi decretada situação de emergência.

O secretário assegura que a interdição da igreja não será suspensa enquanto não forem feitas as obras necessárias para garantir a segurança de quem vai ao templo ou mora e trabalha nas imediações. Mas afirma que o laudo da Defesa Civil deve ser liberado nos próximos dias.

Durante a interdição, os fieis da Senhor dos Passos se reúnem principalmente na Igreja dos Remédios, uma das mais antigas da cidade, porém já restaurada como parte do patrimônio histórico. Uma vez por semana as missas ocorrem na capela do hospital Dom Pedro de Alcântara, administrado pela Santa Casa de Misericórdia.

A dificuldade é que enquanto na Senhor dos Passos cabem 800 pessoas, a pequena Igreja dos Remédios comporta apenas a metade. “Não cabe todo mundo, a gente vai dando um jeito. Mas quanto mais rápido voltar pra igreja Senhor dos Passos melhor”, admite o contador Djalma Pereira, freqüentador da paróquia.

CONSTRUÇÃO DEMORADA

Quem vê a igreja Senhor dos Passos, grande, alta e em estilo neogótico, tende a pensar que se trata de uma construção secular. No entanto ela é relativamente nova. A pedra fundamental foi lançada em 1921. Pelos registros em mãos do padre Miguel a construção só começou mesmo em 1924, parando um ano depois. Em 1936 a igreja foi entregue à comunidade parcialmente pronta e começou a funcionar regularmente.

A obra só foi reiniciada em 1951 e dada como concluída em 1979, 58 anos depois do lançamento da pedra fundamental.

O interior foi restaurado já neste século, por meio de um projeto de apoio à cultura com renúncia fiscal do governo. Imponente por fora e bonito por dentro, com vitrais com personagens bíblicos, a igreja só não possui um acervo de imagens valioso. Apenas quatro, de acordo com o padre Miguel, possuem um valor histórico por serem mais antigas, embora ele não saiba precisar a idade: Nossa Senhora das Dores, São Benedito, Senhor morto e Senhor dos Passos. Estas duas últimas inclusive foram restauradas quando da reforma no interior do templo.

PONTO PARA AMBULANTES

Como fica na esquina de duas das principais avenidas do centro comercial da cidade e ao lado da prefeitura, a lateral da igreja é um ponto privilegiado para o comércio ambulante. São mais de 10 barracas de camelôs que chegavam a usar como cabide as grades que separam a rua do templo.

Após a interdição em 18 de março, todos os ambulantes foram removidos. Dois outros pontos foram testados pela prefeitura. Mas com a colocação de tapumes em volta da construção, afastados das grades, os vendedores foram autorizados a voltar.

“Aqui é o miolo da cidade e tem gente com mais de 30 anos no ponto. Quando mudamos para um local ruim tinha gente até voltando para casa a pé depois do trabalho, porque não ganhava dinheiro nem para pagar a condução”, afirma o camelô Roberto Moreira, vendedor de bijouterias.

Instalado ao lado dos tapumes, ele diz que não tem medo de qualquer acidente. “Só corria risco quando estava encostado na grade. Se cair alguma coisa agora não chega aqui não”, acredita.

Para Jacionildo de Jesus, que vende exclusivamente sombrinhas e guarda-chuvas, a localização é tão privilegiada que a interdição não abalou em nada o comércio. “Com a igreja fechada diminuiu o movimento de pessoas, mas as vendas continuam iguais. Aqui é bom demais”, atesta.


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