9.7.10

Com greve no SUS, pacientes pobres pagam caro por cirurgias

Valdelice se prepara para a cirurgia, enquanto José Nilton espera na Casa de Saúde Santana (fotos Reginaldo Pereira)

Após um mês na fila esperando por uma cirurgia gratuita pelo SUS, a auxiliar de serviços gerais Valdelice Ramos Pereira entrou finalmente ontem na sala de cirurgia do hospital Casa de Saúde Santana. Mas para isso precisou pagar R$ 2 mil. Isso porque os anestesistas que atendem pelo SUS em Feira de Santana estão em greve há 32 dias e só atuam nos casos considerados de emergência, ou seja, quando há risco iminente de morte do paciente.
Valdelice tem varizes e as veias estouraram. “Ela passou um mês sofrendo com o sangue escorrendo pelo corpo, enquanto a família tentava reunir o dinheiro”, conta a irmã Isabel Ramos, acompanhante no hospital.
Com o movimento dos anestesistas, entre três e quatro mil cirurgias consideradas eletivas deixaram de ser feitas pelo SUS em Feira de Santana, de acordo com o secretário de Saúde, Rafael Cordeiro.
Os pacientes que não aguentam esperar tentam conseguir o dinheiro para fazer a cirurgia pagando a equipe médica, equipamentos, remédios e internação do próprio bolso.
O lavrador José Nilton de Oliveira é um deles. Caiu do cavalo na zona rural de Teofilândia, na região de Feira de Santana, e quebrou o braço em duas partes. Com o braço enfaixado, ele se queixa das dores e do fato de não estar podendo trabalhar desde o acidente, há 15 dias. Ganha R$ 20 por dia quando encontra trabalho para fazer na roça. Mas precisou pegar emprestado R$ 1.700,00 para pagar a cirurgia também marcada para ontem. O equivalente a quase 90 dias de trabalho.
Os anestesistas estão em greve porque querem aumento, já que os valores pagos pela tabela do SUS são considerados muito baixos. São R$ 14,90 em uma cirurgia de hérnia, R$ 30,95 em fratura de clavícula e R$ 74,54, o valor máximo, em cirurgia de fêmur.
Segundo o anestesista Marcelo Carvalho, a proposta inicial dos 17 profissionais que trabalham na cidade foi acrescentar R$ 83 mil mensais à despesa com o setor, para serem divididos pelo grupo. Após seguidas negociações, os médicos reduziram o valor para R$ 50 mil, enquanto a prefeitura chegou a uma proposta de R$ 30 mil e agora os dois lados se mostram irredutíveis. Como a tabela do SUS é definida pelo Ministério da Saúde para todo o país, os valores extras seriam pagos através de convênio com a Santa Casa de Misericórdia. Por ser uma instituição filantrópica, ela poderia assinar convênio com a prefeitura e depois fazer o repasse aos profissionais, a maioria dos quais atende no próprio hospital da Santa Casa, que realiza mais de 600 cirurgias por mês.
O secretário de Saúde, Rafael Cordeiro, diz que se não houver um acordo, a prefeitura deve implantar um serviço próprio de anestesia, fazer uma licitação para prestação do serviço ou concurso público para integrar anestesistas ao quadro de funcionários do município.
Enquanto isso apenas emergências são atendidas. Segundo Marcelo Carvalho, é o anestesista o profissional mais indicado para identificar a gravidade de cada caso e ele garante que hospitais e clínicas que atendem pelo SUS mantêm permanentemente um profissional de plantão.
O diretor-presidente da Casa de Saúde, Ângelo Mário Silva, queixa-se dos prejuízos que a unidade vem sofrendo com a paralisação, já que está praticamente vazia, pois sobrevive atendendo pelo SUS. Ele informa que 391 pessoas estão na fila de espera. Ângelo Mário cita inclusive um caso de morte de paciente com câncer de próstata, sangrando e em estado terminal, que acabou falecendo sem passar por cirurgia.
Mas o anestesista Marcelo rebate: “Se estava nesta situação, nem poderia ter a cirurgia porque não iria resistir. Seria preciso primeiro tratar e estabilizar”. Ele garante que pacientes de câncer e qualquer outro tipo de emergência estão sendo criteriosamente avaliados pelos grevistas.

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