Reproduzo abaixo artigo publicado ontem nos jornais do país, escrito pela jornalista Dora Kramer, acerca da sanha dos suplentes que insistem em ser vereadores
Na base da chantagem
Qualquer pesquisa de opinião atesta: as principais demandas da população brasileira são serviços de saúde de qualidade, educação ao alcance de todos e combate do Estado à segurança para o público.
Diante dessa agenda, seria de se imaginar que a "Casa do Povo", o "Poder mais transparente e acessível da República" - como gosta de se autonomear o Congresso -, optasse por exercer seu papel de representante de acordo com a pauta proposta pelos representados.
Nesse caso, os assuntos em debate no Parlamento guardariam relação com projetos de alcance futuro e visão estratégica. No lugar disso, o que vemos é um empenho quase obsessivo por questões de interesse exclusivo do Parlamento.
Nelas, se destaca a emenda constitucional que recria a maior parte das cadeiras de vereadores anuladas em 2005 pela Justiça Eleitoral - em decisão corroborada pelo Supremo Tribunal Federal -, mediante uma conta de chegar entre a população dos municípios e a quantidade de representantes com direito a uma cadeira nas Câmaras Municipais.
A questão central é: qual a utilidade de se confrontar um dado técnico da Justiça Eleitoral? É anseio da sociedade a recuperação de mais de 7.700 vagas de vereador Brasil afora? Estariam os munícipes a se sentirem subtraídos em seus direitos?
Nem uma coisa nem outra. O assunto só tem relevância para os vereadores. E por que assumem importância capital para os parlamentares com representação federal, ao ponto de conferirem ao assunto prioridade absoluta, um caráter de guerra a ser vencida desde 2005?
A resposta está no relato do deputado Chico Alencar a respeito do que vê no dia a dia do Parlamento: "Os corredores da Câmara estão alvoroçados pela presença de centenas de representantes de uma nova "categoria social", a dos suplentes de vereadores, que ameaça os que têm visão crítica" sobre o projeto de ampliação das vagas.
De acordo com o relato do deputado, a pressão se expressa numa frase dirigida aos deputados federais e senadores: "Cuidado, o ano que vem está aí."
Ameaçam os parlamentares cujos mandatos estarão em jogo em 2010 de negar-lhes os serviços de cabos eleitorais para a renovação dos respectivos mandatos.
Exercem essa pressão de maneira retumbante. Nada contra o sagrado direito dos grupos de pressão. A menos que ele se configure numa chantagem explícita, como é o caso em questão.
Junte-se a isso a dita reforma eleitoral ora em tramitação no Senado, com alterações que visam apenas a atender as conveniências imediatas dos partidos - restrição ao uso da internet, autorização às doações "ocultas" e liberação das "fichas-sujas"- e o que se tem é o que o deputado Chico Alencar chama de operação de miudezas.
Em prejuízo de questões de interesse nacional, pois não se ouvem vozes no Congresso a reverberar os desejos, as demandas, as necessidades da maioria.
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