6.3.06

A fome contra Lula

A fome já foi cabo eleitoral do presidente Lula, que fez do programa Fome Zero um dos principais cavalos de batalha de sua eleição. Agora ela se volta contra ele, por causa do bispo de Barra em greve de fome.

Na época da posse, Lula dizia que sua meta era que todo brasileiro comesse pelo menos três vezes por dia, no café, no almoço e no jantar. Agora, mais preocupado em manter a popularidade que lhe resta, ele certamente se contentaria que o bispo Luiz Flávio Cappio fizesse refeições.

Afinal, ninguém sabe quantos nem quem está passando fome Brasil afora. Andaram até dizendo que a obesidade é um problema maior do que a fome, mesmo entre os pobres. Mas a fome do bispo é notícia nacional, logo logo vira mundial.

A fome do bispo incomoda tanto que Lula já se saiu muito mal ao comentá-la (não precisa dizer que foi em discurso, porque entrevista o presidente só dá quando está fora do Brasil, respirando ares mais democráticos – ou republicanos, como os petistas gostam de dizer e dizem com propriedade, pois depois de meses esbravejando nos palanques ele deu entrevistas, apressadas, acossadas, nos corredores, mas deu, enquanto estava na reunião da ONU em Nova York, cidade símbolo do país do republicano Bush).

Mas, como dizia, Lula reclamou que se cada vez que o governo propusesse qualquer coisa e alguém que fosse contrário entrasse em greve de fome, ficaria complicado.

Uma fala que transmite a impressão de que o presidente considera o ato extremo do religioso quase sexagenário uma birra, uma implicância, uma atitude inconseqüente e uma banalidade, que pode ser praticada por qualquer um.

Pior ainda foi o arremate da fala presidencial: “Mas eu tenho paciência de Jó”. Como se ele estivesse sofrendo e sendo testado mais do que o homem que assume um sacrifício pessoal e coloca em risco a própria vida, em nome de uma causa que considera vital para o próximo.

Como para político voto é a única coisa vital, o presidente deveria tomar mais cuidado com o que fala, ainda mais quando envolve a Bahia, estado que em seguidas eleições tem lhe confiado votações maciças, proporcionalmente as maiores entre todos os estados do Brasil.

Assim evitaria que a Bahia também se voltasse contra ele, como a fome se voltou.

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